sexta-feira

O HOMEM DE GELO

O HOMEM DE GELO (The iceman, 2012, Millenium Films, 106min) Direção: Ariel Vromen. Roteiro: Ariel Vromen, Morgan Land, livro de Anthony Bruno, documentário "The Iceman Tapes: Conversations with a killer", de Jim Thebaut. Fotografia: Bobby Bukowski. Montagem: Danny Rafic. Música: Haim Mazar. Figurino: Donna Zakowska. Direção de arte/cenários: Nathan Amondson/Teresa Visinaire. Produção executiva: Rene Besson, Anthony Bruno, Boaz Davidson, Danny Dimbort, Mark Gill, Lati Grobman, Laura Rister, Trevor Short, Jim Thebaut, John Thompson. Produção: Ehud Bleiberg, Avi Lerner, Ariel Vromen. Elenco: Michael Shannon, Winona Ryder, Ray Liotta, Chris Evans, David Schwimmer, James Franco, Stephen Dorff. Estreia: 30/8/12 (Festival de Veneza)

Michael Shannon é um monstro de ator (no bom sentido): intenso, dedicado e frequentemente requisitado para papéis que exigem imponência ou certo grau de ameaça - graças a seu olhar penetrante e sua vaga semelhança física com Christopher Walken, por muito tempo o malucão preferido de Hollywood -, Shannon não poderia ter sido a melhor escolha para interpretar Richard Kuklinski, um dos assassinos mais conhecidos da história dos EUA, que por trás da fachada de homem de família respeitável, foi responsável por cerca de 200 mortes, a maioria delas encomendadas pelas cinco famílias mafiosas de Nova York. Dono do apelido de Homem de Gelo, por seu costume de congelar as vítimas por um tempo antes de desovar o corpo (dificultando assim a definição exata da data de suas mortes), Kuklinski foi tema de um documentário da HBO chamado "America undercover: The iceman tapes - conversations with a killer" e um livro escrito por Anthony Bruno. As duas obras acabaram por ser a base de "O homem de gelo", longa-metragem dirigido por Ariel Vromen que, contando com a atuação gigantesca de Shannon, acompanha a trajetória do protagonista desde seu início na vida do crime até sua prisão, em 1986. Narrado de forma convencional e com um roteiro que não explora a contento todas as possibilidades oferecidas pela história, o filme se vale do talento de seu ator principal e do elenco coadjuvante para manter a atenção do público até o final - ainda que nem mesmo seu clímax chegue a ser empolgante como poderia.

Sem explorar o passado traumático e cercado de violência de seu personagem central, o que certamente explicaria boa parte de sua personalidade calculista e quase apática em relação aos crimes que comete, "O homem de gelo" concentra-se basicamente na transformação de um homem comum em um dos maiores assassinos dos EUA. De dublador de filmes pornográficos a matador de aluguel, Kuklinski praticamente tinha uma vida dupla: de dia, era um respeitável pai de família, casado com a doce Deborah (Winona Ryder substituindo Maggie Gyllenhaal, que saiu do filme devido à gravidez) e pai de duas meninas; em horário comercial, um criminoso frio e implacável que trabalha para o perigoso Roy Demeo (Ray Liotta em papel oferecido a Benicio Del Toro). Sem importar-se muito em detalhar as mortes cometidas por Kuklinski, o roteiro vai contando sua história sem pressa, até chegar o momento em que o protagonista entra em rota de colisão com Demeo: trabalhando por conta própria ao lado do excêntrico Robert Pronge (Chris Evans, ótimo), ele vê a si e a família ameaçados, o que o obriga a entrar em um período de tensão e paranoia crescentes - especialmente porque ninguém de suas relações pessoais sabe a respeito de sua verdadeira profissão.


Dotado de uma estrutura narrativa simples e sem apelar para a violência excessiva - apesar do tema e do personagem central de certa forma exigirem tal opção -, "O homem de gelo" parece mais um telefilme do que uma produção para o cinema. Apesar do elenco talentoso, sua falta de ousadia em contar uma história tão repleta de possibilidades incomoda a um público já acostumado com o gênero e que busca algo mais do que um roteiro quadradinho e que deixa de lado questões importantes - como o fato de Kuklinski ser também violento em casa, frequentemente espancando a esposa. Até mesmo a razão de seu apelido (o congelamento de suas vítimas) é mencionado apenas brevemente, quase como se fosse algo sem importância. A direção de Ariel Vromen - responsável por produções da Netflix, Warner e Lionsgate, entre outros - não empolga em nenhum momento, nem mesmo no terço final, quando finalmente Kuklinski se vê encurralado pelas consequências de seus atos e precisa lidar com a pressão de estar no papel de possível vítima. Michael Shannon brilha em cada cena, mas não consegue escapar das armadilhas de um roteiro pouco inspirado.

No final das contas, "O homem de gelo" é um filme apenas correto, com poucos momentos memoráveis e que deixa a sensação de que poderia ter sido um grande trabalho caso não tivesse optado pelo convencionalismo excessivo. Uma pena que uma história tão rica de possibilidades tenha ficado no meio-termo adotado por seu diretor. Está longe de ser um filme ruim, mas tampouco é um filme que mereça destaque - exceto talvez pelo belo desempenho de Michael Shannon, que consegue ser melhor que o filme em si. Segura bem uma tarde chuvosa, mas não marca a vida de ninguém da plateia - quase uma decepção em se tratando do tema e do elenco.

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