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NO (No, 2012, Participant Media/Funny Balloons, 118min) Direção: Pablo Larraín. Roteiro: Pedro Peirano, peça teatral de Antonio Skármeta. Fotografia: Sergio Armstrong. Montagem: Andrea Chignoli. Música: Carlos Cabezas. Figurino: Francisca Román. Direção de arte/cenários: Estefania Larrain/María Eugenia Hederra. Produção executiva: Juan Ignacio Correa, Mariane Hartard, Rocío Jadue, Jonathan King. Produção: Daniel Marc Dreifuss, Juan de Dios Larraín, Pablo Larraín. Elenco: Gael García Bernal, Alfredo Castro, Luis Gnecco, Néstor Cantillana, Antonia Zegers, Elsa Poblete. Estreia: 18/5/12 (Festival de Cannes)

Indicado ao Oscar de Melhor Filme Estrangeiro

Entre 1973 e 1988, o Chile viveu sob uma feroz ditadura militar, representada na figura do General Augusto Pinochet, que assumiu a presidência depois de derrubar, através de um golpe de estado, o eleito Salvador Allende. Sob forte pressão popular - e acreditando que jamais sairia derrotado de uma eleição depois de tanto tempo no comando - o ditador aceitou, então, a proposta de realização de um plebiscito que decidiria sua continuidade ou não como chefe do país. Como parte do processo, uma campanha televisionada no período de 27 dias, com quinze minutos de duração para cada time. Seria democrático se o governo não tivesse muito mais recursos do que a oposição - mas a luta pela justiça encontra forças na adversidade, na paixão de seus militantes e na busca constante pela liberdade. Essa é a mensagem por trás de "No", belo trabalho do cineasta Pablo Larraín, indicado ao Oscar 2012 de melhor filme estrangeiro. Baseado em uma peça teatral escrita pelo mesmo Antonio Skármeta de "O carteiro e o poeta", o filme de Larraín é centrado basicamente na batalha dos opositores ao regime, que, mesmo dispondo de pouco dinheiro e apoio oficial, conseguiram derrubar um dos mais sangrentos e vis golpes de estado da história da América Latina.

A trama centra-se em René Saavedra (o sempre ótimo Gael García Bernal), publicitário jovem e talentoso, que é convidado para participar da organização da campanha pelo "Não" - que, vitoriosa, obrigaria o governo a clamar por novas eleições diretas. Filho de exilados políticos, o rapaz hesita em aceitar a proposta mesmo sendo simpático à causa, especialmente porque seu patrão, Lucho Guzmán (Alfredo Castro), é um dos diretores da campanha oposta. Sabendo que está mexendo com um vespeiro, porém, René aceita o desafio e passa a colaborar com a criação de uma série de pequenos filmes que celebram a alegria e a liberdade - em oposição ao que muitos participantes da campanha desejam, por considerar o assunto sério demais para ser tratado com leveza. Conforme o tempo vai passando e as diferenças criativas vão sendo superadas (ou não), o governo começa a perceber que talvez tenha sido uma péssima ideia dar voz a seus inimigos, principalmente em rede nacional.


Para dar mais realismo às cenas, Larraín, em seu projeto mais acessível ao grande público - depois de sucessos de crítica mais densos e herméticos, como "Tony Manero" (2008) e "Post Mortem" (2010) - utilizou-se de câmeras utilizadas no final da década de 80, criando sequências que parecem realmente ter saído do momento histórico que retrata. Intercalando cenas do filme com imagens das campanhas reais, o cineasta insere o espectador dentro da jornada de René e seus companheiros rumo à liberdade tão sonhada. Sem disfarçar sua simpatia pelo fim da ditadura, o roteiro questiona os argumentos daqueles favoráveis ao regime sem, no entanto, apelar para o didatismo ou o panfletário, acreditando plenamente na força da história e seus desdobramentos. Ao impor a narrativa sob a ótica de Saavedra - um cidadão comum, que viveu todos os problemas da ditadura sem estar nos bastidores do poder - Larraín enfatiza o óbvio: um regime ditatorial e opressor afeta a todos, por mais que se tenha a ilusão de liberdade e progresso. Quando decide comprar a briga pelo "Não", o protagonista compra também uma série de consequências que podem destruir sua carreira e sua família, e sua coragem é que lhe transforma em herói - ao menos um herói do dia-a-dia, capaz de, com pequenos gestos, transformar seu pedaço de mundo e aqueles a seu redor. Não deixa de ser surpreendente que o diretor desse conto de esperança seja Larraín, um cineasta pouco afeito a delicadezas e finais felizes.

Empolgante como um thriller político - mas sem o peso de um Costa-Gavras ou Oliver Stone - "No" é uma produção pequena em ambição mas grandiosa em resultados. A indicação ao Oscar foi apenas consequência de um trabalho cuidadoso, apaixonado e inteligente, capaz de conquistar até mesmo àqueles avessos a qualquer tipo de filme do gênero. Com um roteiro fluido e esperto, uma direção discreta que jamais comete excessos e um elenco impecável - liderado por um inspirado Gael García Bernal, perfeito em viver tipos comuns - é uma pequena obra-prima do cinema chileno, competente em todos os aspectos e fascinante como drama humano e social. Uma mostra e tanto do novo cinema latino-americano.

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